Norma Culta ou preconceito linguístico?

Norma Culta ou preconceito linguístico?


Quando há cobranças ou quando se há preconceitos por não ser utilizada a “Norma Culta”, há de se fazer uma reflexão de um possível entendimento de que a língua está ligada à cultura e já que no Brasil existem varias manifestações culturais, temos varias “línguas”. Deve-se haver um cuidado ao se falar em “Norma Culta” e qual das culturas relativamente ligadas está sendo privilegiada.
O escritor e linguista Marcos Bagno responde esta questão dizendo que a norma culta não existe, e sim as variantes de prestigio de um determinado grupo, de uma determinada localidade, como a exemplo da França que quando a Burguesia assumiu o poder no lugar da Aristocracia a “variante de prestígio” mudou. A partir deste contexto podemos entender que a variante de prestigio é escolhida por um determinado grupo que está no poder, deixando as outras variantes sem reconhecimento, ou seja, estigmatizadas, marginalizadas surgindo assim o preconceito linguístico com aqueles que não seguem as normas adotadas.  A dominação de classe Social se efetiva por meio da linguagem, direcionando que, em uma sociedade, a linguagem de maior prestígio tende a ser da classe dominante que, assim, assegurará a difusão de suas ideologias e a reprodução de seu status de dominador.
No Brasil seguimos um padrão gramático ultrapassado, vindo de Portugal e defendido por muitos autores, como é o caso da escritora e jornalista Dad Squarisi, que defende a gramática normativa e chama os brasileiros de “caipiras, “jeca-tatu” e matuto”, evidenciando que o preconceito existe. Em seu texto “português ou caipirês?", percebemos claramente o preconceito quando a autora foi favorável à declaração que o então presidente Fernando Henrique Cardoso dera em Portugal, de que os brasileiros são todos “caipiras”, Porém, ao lermos “O Estigma do Português” de Mário Eduardo Viário vemos que muitas variantes usadas para designar, discriminar e ofender os nordestinos, interioranos e todos que não falam seguindo as normas impostas, estavam e está presente em Portugal desde o século XIX, como é o caso das palavras: “arve”, “urtima”, “prantar”, “nos semos”, “marfeito”, “púbrico” etc. A semelhança das formas portuguesas com a “caipira” do Brasil nos surpreende e desencadeou estudos científicos por parte da USP e UNESP.
Talvez o que eis Presidente não pensou é que o português falado no Brasil é bem diversificado, ainda que, a escola tenta impor a norma lingüística como se fosse de fato comum a todos os brasileiros há diferenças de status social em nosso país que explicam a distância entre os falantes das variedades não-padrão e os falantes da norma culta, que é a língua ensinada na escola. Marcos Bagno, indaga que “preconceito lingüístico é dizer que o “certo” é falar e aceitar a língua que é”.
ensinada na escola. Mas e quem não tem acesso à escola não sabe falar o
português?
O preconceito lingüístico é um preconceito social. É uma discriminação sem fundamento que atinge falantes inferiorizados por alguma razão e por algum fato histórico. Nós o compreenderíamos melhor se nos déssemos conta de que ‘falar bem’ é uma regra da mesma natureza das regras de etiqueta, das regras de comportamento social. Os que dizemos que falam errado são apenas cidadãos que seguem outras regras e que não têm poder para ditar quais são as elegantes.

Por falar em elegância na Língua não podemos esquecer do ilustríssimo escritor Guimarães Rosa tão estudado pelas variantes da língua:
Citemos dois trechos:

“Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa.”

“Sempre sei, realmente. Só o que eu quis todo o tempo, o que eu pelejei para achar, era uma coisa só - a inteira - cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que sempre tive. A que era: que existe uma receita, a norma dum caminho certo, estreito, de cada pessoa viver - e essa pauta cada um tem - mas a gente mesmo, no comum, não sabe encontrar; como é que, sozinho, por si, alguém ia poder encontrar e saber?”

Enfim podemos concluir que uma língua é um fenômeno mais complexo do que parece ser quando apresentada apenas em termos prescritivos.

É difícil acreditar que em pleno século XXI, exista o “Preconceito Linguístico”, mas é evidente que existe e que está longe de ter um fim. Há de se tentar entender o que está certo ou errado e como somos afetados nesse contexto, há de se posicionar na defesa da liberdade de expressão, pois quantos termos se perderam e se perdem por este ou aquele nos dizer que é errado, que não está certo, que não podemos usar, manifestando-se como os donos da verdade, há de se criar um conceito sobre o “Preconceito.”.

Penso que o escritor Fernando Veríssimo resume as teorias do preconceito linguístico em sua frase concludente:

 “Escrever claro não é certo, mas é claro certo?”

Rômulo

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