RESENHA DO LIVRO: ANTROPOLOGIA DA CRIANÇA

“Antropologia da criança” é um livro da coleção passo a passo (Editora Zahar) da Doutora em Antropologia pela USP, Clarice Cohn. O livro possui 58 páginas divididas em 13 tópicos, nos sete primeiros a autora fala sobre as contribuições da antropologia nos estudos da criança, desde os estudos pioneiros até os novos, onde promove uma reflexão sobre a criança, à infância, sua atuação, produção de cultura, educação e aprendizagem. A partir do oitavo tópico discorre sobre a aplicação da pesquisa na interdisciplinaridade, seus métodos, técnicas e conclui sobre “as crianças daqui e de lá”. Os estudos neste livro fazem um mapeamento das varias abordagens antropológicas, além de discussões sobre os limites e possibilidades de uma “antropologia da criança” e no final recomenda leituras para aqueles que desejam ampliar conhecimentos.
O livro se inicia com questionamentos acerca de “O que é a criança? O que é ser criança? Como vivem e pensam as crianças? O que significa infância e quando ela termina?”, o interesse da autora é mostrar que apesar de autores famosos descreverem textos saudosos da infância, há grande variação de ideias e que apenas dividir o mundo adulto e infantil não contempla os estudos da antropologia, para ela o antropólogo deve ser capaz de observar o mundo com os olhos de uma criança para tentar entender seu processo de formação através do contexto sociocultural em que estão inseridas tornando-as “objeto legitimo de estudo”.
Na primeira parte Cohn descreve os estudos pioneiros em antropologia citando como um dos mais importantes a escola culturalista norte americana, fundada por Franz Boas. Essa escola delimitou definindo a cultura transmitida de geração para geração como particular e o que é construído sem interferência (inato no ser) universal formando a dicotomia inato x adquirido. O estudo mais famoso segundo a autora é a da psicóloga e antropóloga Margaret Mead que em pesquisa na ilha norte americana de Samoa concluiu que os conflitos e rebeldia juvenis americanas são dados culturais e não podiam ser explicados por uma condição biológica, pois o conceito de adolescência deveria ser definido a partir do contexto em que a criança está inserida. Apesar das duras criticas recebidas Mead continuou os estudos e coletas de dados em Manu e Bali deixando grandes contribuições para a antropologia como visibilidade aos estudos das crianças e sugestões de métodos, temas, coletas e analise de dados.
Pensamentos contrários surgiram com a escola estrutural - funcionalista, ela negou o psicologismo dos estudos de Margaret Mead com a tese de que o importante no processo é a “socialização dos indivíduos”, ou seja, o lugar ocupado pela criança no sistema é definido pelo próprio sistema. Segundo Cohan todos as correntes de estudo contribuíram no avanço dos estudos, porém ainda faltava dar um passo adiante e abordar os estudos das crianças a partir de si mesmas.
Em outra parte da obra a autora fala dessa nova abordagem antropológica ocorrida na década de 1960, onde antropólogos reavaliaram conceitos e passaram a estudar as crianças de maneira inovadora. Esse inovação deixou de valorizar crenças, valores e costumes em si como pontos importantes  e focaram na forma em que eles eram acionados pelo ser dentro da sociedade. O foco nessa funcionalidade transformaram os seres em atores sociais e a sociedade passou a ser encarada como um sistema simbólico dentro de um contexto, no qual o individuo deixou de ser apenas um receptáculo de informação, para se tornar um “ator social” em um papel que criam enquanto vivem.
A partir destas inovações a obra de Cohn traça aspectos importantes conceituando infância como forma particular, estabelecida pela sociedade e, pode ou não existir em outra sociedade. Essa pré - definição de quando começa e termina a infância é contraditória nos próprios estatutos de uma dada sociedade como no caso do aborto em que uns são contra e outros a favor, seja por questões religiosas, biológica etc.
Então passam a encarar a criança como atuante no meio em que vive. Essa atuação interage com os adultos, outras crianças e o mundo que a rodeia. Para a autora as condições que cercam os pequenos não fazem deles nem vitimas e nem algozes, são apenas produtos da construção da identidade social. A antropologia revoluciona ao pesquisar o sistema simbólico usado por eles na construção de sentido e significado. Essa pesquisa tomou cuidado para não confundir o pensamento delas com os pensamentos compartilhados pelos adultos em sua formação.
A obra de Cohn também faz uma reflexão sobre a educação e aprendizagem dizendo que se deve começar do começo, que o ensino acontece de maneira “formal” e “informal” e que algumas situações essa educação deve ser formalizada, porém como há no mundo tantas formas estabelecidas é necessário que esse aprendizado seja interligado, assim como a antropologia, a psicanalise e a psicologia que devem dialogar para entender melhor a formação desse novo ser. O livro convida também as escolas que passem a olhar as crianças como atores sociais que interagem, modificam e produzem no meio em que vivem. Para isso cada instituição deve buscar nos modelos de pesquisa, aquela que se enquadra à sua realidade utilizando – se de recursos como coleta de desenhos, produção de textos e relatos áudio visuais, pois as crianças de lá são as mesmas daqui, o que muda são os contextos.

Considerações finais:

O Livro “Antropologia da criança” é voltado para o público em geral e não apenas a especialistas, ele aborda e questiona as definições pré-estabelecidas do que é ser criança, quando começa e quando termina a infância. Essa abordagem busca trazer em debate como se dá a relação da formação do novo ser e mostra que os estudos antropológicos podem e devem dialogar com outras ciências de maneira a contribuir na formação das crianças. Esse debate e dialogo se faz presente na obra de maneira clara e mostra ao interessado em geral os avanços e o quanto ainda falta avançar no misterioso mundo infantil.

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